segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Acorda, homem, é PRIMAVERA!


Em setembro, Deus olhou para a Terra e viu o homem prostrado em seus dissabores, deitado na escuridão de si mesmo, depressivo até o fundo da alma, andando trôpego pelos desertos da sua vida árida, sem um pingo de alegria no rosto - e resolveu fazer alguma coisa.

- Olha, trouxe a primavera para você. Festeje! - Não estou a fim! respondeu o homem, sem levantar os olhos.

-Veja as flores lindas e perfumadas que coloquei nas plantas para alegrar você. -Ponha num vaso e deixe por aí resmungou o homem inexpressivamente.

Deus ficou com pena da sua criatura e animou-a: - Estendi um lindo tapete verde nos campos, pintei de colorido as florestas, dei novas formas às flores, inundei de perfume os ares, revigorei a energia dos animais. Venha ver. O homem sequer abriu os olhos: - Outro dia disse secamente.

Deus não se conteve: - Já percebeu como o sol está mais resplandecente, as estrelas brilham como nunca, a lua passeia airosa no céu, os pássaros cantam, dançam, amam, fazem ninhos e encantam a vida das pessoas? Está tudo tão lindo! Acorda, homem, é primavera!

- Como posso, Senhor, me ocupar dessas coisas, quando estou afogado em compromissos, dívidas e projetos inacabados?! Perdi o meu Amor, estou deprimido e Tu vens me azucrinar com essas coisas sem sentido?! E o homem mandou Deus estudar psicologia, filosofia, teologia, sociologia, psicanálise, para ter um pouco mais de conhecimento sobre a realidade humana.

Assim é a vida: o ser humano só verá a primavera lá fora se tiver a primavera no coração. Há pessoas que rejuvenescem junto com a primavera: cantam, dançam, passeiam, desfrutam, louvam o Criador, abençoam a vida, sorriem; outras seguem afundadas na sua escuridão hibernal interior.

Deus fez a parte dele, mas cada um só consegue ver através dos olhos interiores. Assim como estiver a sua mente, assim estará o mundo exterior.

Quer saber como está a sua vida? Responda a esta pergunta: Chegou a primavera? Olhe para as árvores, para os jardins, para as montanhas, para os céus, para os pomares e diga se chegou ou não a primavera. Sua resposta mostra seu estado de ânimo.

(Lauro Trevisan)  

Por este mundo

Ó Deus, nós te damos graças por este universo, nosso lar; pela sua vastidão e riqueza, pela exuberância da vida que o enche e da qual somos parte. Nós te louvamos pela abóbada celeste e pelos ventos, grávidos de bênçãos, pelas nuvens que navegam e as constelações, lá no alto.
Nós te louvamos pelos oceanos, pelas correntes frescas, pelas montanhas que não se acabam, pelas árvores, pelo capim sob os nossos pés. Nós te louvamos pelos nossos sentidos: poder ver o esplendor da manhã, ouvir as canções dos namorados, sentir o hálito bom das flores da primavera.
Dá-nos, rogamos-te, um coração aberto a toda esta alegria e a toda esta beleza, e livra as nossas almas da cegueira que vem da preocupação com as coisas da vida e das sombras das paixões, a ponto de passar sem ver e sem ouvir até mesmo quando a sarça, ao lado do caminho, se incendeia com a glória de Deus. Alarga em nós o senso de comunhão com todas as coisas vivas, nossas irmãs, a quem deste esta terra por lar, juntamente conosco.
Lembramo-nos, com vergonha, de que no passado nos aproveitamos do nosso maior domínio e dele fizemos uso com crueldade sem limites, tanto assim que a voz da terra, que deveria ter subido a ti numa canção, tornou-se um gemido de dor.
Que aprendamos que as coisas vivas não vivem só para nós; que elas vivem para si mesmas e para ti, que elas amam a doçura da vida tanto quanto nós, e te servem, no seu lugar, melhor que nós no nosso.
Quando chegar o nosso fim, e não mais pudermos fazer uso deste mundo, e tivermos de dar nosso lugar a outros, que não deixemos coisa alguma destruída pela nossa ambição ou deformada pela nossa ignorância. Mas que passemos adiante nossa herança comum mais bela e mais doce, sem que lhe tenha sido tirado nada da sua fertilidade e alegria, e assim nossos corpos possam retornar em paz para o ventre da grande mãe que os nutriu e os nossos espíritos possam gozar da vida perfeita em ti.'

(Orações por um mundo melhor, Walter Rauschenbusch, PAULUS, 1997)

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

ORAÇÃO PELOS AMIGOS

Elevo minha voz a Jesus que me diz:
“Não vos chamo servos, mas amigos, pois ao amigo eu me dou a conhecer”.
Que eu possa servir aos meus amigos, em todas as situações,
Rezo pelos amigos que servem a Deus como eu, que continuem fiéis.
Rezo por aqueles que não são de Deus, mas que nem por isso deixam de ser amigos.
Peço a conversão de alguns, pois por ai passará a felicidade para eles.
Como aconteceu com Jesus, por alguns amigos a minha oração são as lágrimas.
Para outros um sorriso ou minha presença é motivo de ressurreição.
Há amigos tão próximos, que o silêncio fala mais do que mil palavras.
Peço respeito e paciência para aqueles que tenho de conquistar todo dia.
A paz é algo que peço para todos, saúde e o necessário de cada dia.
Que eles Senhor se realizem no trabalho e no amor.
Rezo por amigos que precisam conquistar novos amigos,
Que o Senhor cure as feridas e as marcas da vida,
E que liberte do mal mascarado nos vícios e no pecado.
Para aqueles que vivem presos no passado, remoendo as amargas lembranças,
Eu peço Senhor a libertação, a cura do coração, a verdadeira liberdade.
Há outros eu ofereço o meu amor e percebo que só isso basta.
Há nenhum deles eu nego a prece dos meus ombros e dos meus ouvidos,
Pois carentes como eu, isso nos faz mais amigos.
Rezo para que o Senhor realize a Sua Vontade na vida deles,
E não aquilo que eles querem, pois nem sempre é o melhor.
O Senhor, que conhece o meu coração sabe que nem todos são meus amigos,
Por isso, rezo pelos meus possíveis inimigos, que vivamos o amor heróico.
Uno o meu coração com aqueles amigos, que já partiram desta vida,
Eles aumentam os meus desejos pelo céu, com eles a eternidade será  mais feliz.
Agradeço pelos meus amigos “anjos sem asas”, que Deus colocou em minha vida;
Por causa deles sou bem mais feliz.
Peço que para sempre continuemos amigos,
E no céu possamos nos encontrar e dividir a eterna felicidade.
Enfim, peço que eles conheçam o meu melhor amigo: Jesus Cristo.
E que experimentem uma amizade que pode suprir todas as suas necessidades.
Pois pior do que o mundo sem amigos,
É uma alma sem Deus. 
Amém.

quarta-feira, 20 de março de 2013

O Outono


Foi-se, finalmente, o Verão, não sem antes fazer
algumas grosserias e malcriações: trovejou, relampejou, choveu, inundou. 
Não queria ir embora. Compreendo. Queria ficar para ver e namorar o Outono, que é
muito mais bonito que ele. Verão, quarentão: recusava-se a aceitar os sinais da
passagem do tempo. Não queria dizer adeus. Gostaria de ficar. A vida é tão boa!
Mas o tempo é implacável. O sol lhe disse que a hora do seu adeus havia
chegado. Foi se inclinando no céu, suas viagens cada vez mais curtas, as noites
mais longas, o crepúsculo chegando mais cedo, as manhãs chegando mais tarde. O
vento, antes, convidava a que se tirasse a camisa. Agora ele causa arrepios e
chama os agasalhos das gavetas onde dormiam. O céu fica mais azul. Deve ter
sido numa tarde de Outono que os Beatles compuseram aquela balada que canta
 “... because the sky is blue it makes me cry...” 
E o verde das plantas fica mais verde. 
No Verão, o excesso de luz ofusca as cores. 
No Outono, a luz fica mais mansa e as cores desabrocham como flores. 
O Verão é inquieto. Tudo nele convida a sair e a agir.
 O Outono é tranqüilo, introspectivo, convida ao recolhimento e à meditação. 
É um convite ao pensamento.

Gosto especialmente das suas tardes.
 O Verão é estação do meio-dia. 
O Outono vive mais ao sol que se põe. 
E como são belos os dois, Outono e tardes. 
Há uma pitada de tristeza misturada no ar. 
“O que é bonito enche os olhos de lágrimas”, diz a Adélia.
 Os dois se parecem porque os dois estão cheios de adeus.
A tarde “... é este sossego do céu/ com suas
nuvens paralelas/ e uma última cor penetrando nas árvores/ até os pássaros.
/ É esta curva dos pombos, rente aos telhados,/ este cantar de galos e rolas, muito
longe;/ e, mais longe, o abrolhar de estrelas brancas,/ ainda sem luz...”

Na cidade onde eu vivi, no interior de Minas, ao
crepúsculo se tocava a Ave Maria, e era como se toda a natureza parasse e rezasse.
Eu gostava de ficar olhando para as árvores: havia uma imobilidade absoluta no
ar. Nem um único tremor perturbava a tranquilidade pensativa das folhas. E as
nuvens ao poente se cobriam de verde claro, passando pelos amarelos, laranjas,
e vermelhos, até o roxo, que se preparava para desaparecer na escuridão. Tudo
belo. Tudo triste. E pensávamos pensamentos diferentes daqueles de durante o
dia.

“As nuvens que se ajuntam ao redor do sol que se
põe/ ganham seu colorido triste/ de. olhos que têm atentamente/ observado a
mortalidade dos homens”. 
(Wordsworth)

O crepúsculo e o Outono nos fazem retornar à nossa
verdade. Dizem o que somos. Metáforas de nós mesmos, eles nos fazem lembrar que
somos seres crepusculares, outonais. Também somos belos e tristes... Como o
Verão quarentão, também nós não queremos partir...

“Quando, ao sol que se põe, os rios ficam cor
rosa/ e um leve tremor percorre os campos de trigo,/ parece das coisas surgir
uma súplica de felicidade/ que sobe até o coração perturbado./ Uma súplica de
degustar o encanto de se estar no mundo/ enquanto se é jovem e a noite é bela./
Pois nós vamos,/ como se vai esta onda:/ Ela, para o mar,/ nós, para a
sepultura”. (Paul Bouget).

Quem quer que pare para ouvir as vozes do Outono e
da tarde perceberá que, de dentro da sua beleza, nos falam a nossa vida e a
nossa morte. Nada mórbido. Só podem viver bem aqueles que aprendem a sabedoria
que a morte ensina.

Foi assim que o professor de literatura, no filme A Sociedade dos Poetas Mortos, iniciou o aprendizado dos seus alunos. 
Vocês se lembram? Levou-os até uma fotografia onde se encontravam, imobilizadas sobre o papel, pessoas.
 Agora, todas estavam mortas. Também nós, um dia. A lição da poesia é que é preciso contemplar o crepúsculo no horizonte para se sentir a beleza incomparável do momento. Cada momento é único. Não há tempo para brincadeiras. Carpe diem: colha o dia, como algo que nunca mais se repetirá, como quem colhe um crepúsculo, “antes que se quebre a corrente de prata, e se despedace a taça de ouro...” Beba cada momento até as últimas gotas. É preciso olhar para o Abismo face a face para se cornpreender que o Outono já chegou e
que a tarde já começou. Cada momento é crepuscular. Cada momento é outonal. 
Sua beleza anuncia seu iminente mergulho no horizonte.

Quando o sol está a pino, essas idéias não nos perturbam. 
Tudo parece estar bem. Há muito tempo ainda. As rotinas do trabalho
ocultam a nossa verdade. Mas elas não podem impedir nem que a tarde chegue, com
suas cores de adeus, e nem que o Outono chegue, anunciando a proximidade do
Inverno. E eles nos forçam a ter pensamentos diferentes, pensamentos de
solidão. São mestres silenciosos. Se prestarmos atenção e ouvirmos o que nos dizem,
ficaremos sábios. Porque sabedoria é isto: contemplar o Abismo, sem ser destruídos
por ele. Nas palavras de Rilke, “conter a morte, a morte inteira, docemente,
sem nos tornar amargos.”


Rubem Alves